Como se proteger dos riscos dos equipamentos sem registro e os desafios da fiscalização
“Pirata é todo produto que não possui registro junto à Anvisa ou ainda todo produto / equipamento que não foi importado ou vendido pelo detentor do registro ou por alguém autorizado por ele”, ensina a cartilha da Câmara Brasileira de Diagnóstico Laboratorial (CBDL), uma associação que tem como um dos seus objetivo orientar e promover a troca de informações na área laboratorial. Disponível para consulta no site http://www.cbdl.org.br/, o documento lembra ainda que todo equipamento deve conter a identificação do fabricante, seu número de série (que é único para cada produto) e o registro da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa). “Se um desses itens não constar no equipamento, é provável que seja um produto pirata”, ensina.
A cartilha é parte de um conjunto de ações promovido pela CBDL nos últimos anos contra os produtos piratas. A entidade mantém um acordo de cooperação junto à Anvisa e à Amcham (Câmara Americana de Comércio) para levar adiante essa campanha. Nos congressos da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) e da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC), a CBDL orientou os laboratórios sobre a importância de se adquirir produtos com registros e alertou aqueles que não sabiam que comprar produtos piratas é crime. São produtos que, sem a assistência técnica necessária, podem ter falhas na calibração, o que pode gerar erros nos resultados de exames.
Um dos maiores desafios nessa empreitada é evitar que a necessidade de fiscalização impeça o acesso a novas tecnologias. “Fizemos um trabalho forte junto à Anvisa ao longo desses anos, de discussões e sugestões para maior agilidade no processo de certificação e registro”, relata Liliana Perez, vice-presidente da CBDL. Um grande gargalo está na inspeção das fábricas internacionais, uma exigência que passou a vigorar em maio de 2010, por força da RDC 25, da Anvisa. Já se verificam atrasos de quase quatro anos para o registro de um novo produto. Liliana acredita que, com a revisão de alguns pontos da RDC 25 da Anvisa (resolução sobre boas práticas de fabricação de materiais de saúde que entrou em consulta pública no fim do ano passado), a inspeção nas fábricas deverá ser agilizada. “É possível manter a qualidade do trabalho e otimizar o serviço”, acredita ela. A seguir, a íntegra da entrevista.
Em 2009, a CBDL lançou uma campanha de esclarecimento a respeito da importância para a área de diagnóstico in-vitro de ter equipamentos e materiais adquiridos de empresas idôneas, devidamente regulamentados perante a Anvisa e que tenham o registro válido. Quais foram os resultados dessa campanha? O que mudou de lá para cá?
A campanha foi feita nos Congressos da SBPC e da SBAC e foi muito bem recebida pelos laboratórios, além de servir de alerta para aqueles que desconheciam que adquirir produtos sem registro é crime. Em junho de 2010 assinamos um acordo de cooperação junto à Anvisa, Amcham e outras entidades com o objetivo de promover ações voltadas ao combate à pirataria de produtos submetidos à vigilância sanitária. Desde então, temos procurado difundir a importância do uso de produtos com qualidade e registrados na Anvisa.
Um laboratório que adquira um produto sem registro está sujeito a que danos e riscos?
Além de eventuais problemas de qualidade ou quebra, sem peças para reposição ou mesmo suporte técnico, adquirir produtos sem registro é classificado como crime hediondo e inafiançável, e as penas podem chegar a até 15 anos de reclusão, conforme os artigos 273 e 334 do Código Penal.
Quais são as principais consequências, especificamente em termos de segurança e qualidade?
Como esses produtos não são fornecidos pelo fabricante, as empresas que os oferecem não podem garantir seu desempenho, não possuem peças de reposição e, muitas vezes, não sabem como consertá-los.
Poderia dar exemplos?
Os casos mais comuns são de equipamentos recuperados por empresas sem vínculo com o fabricante. Quando há necessidade de reparo, essas empresas não têm acesso às peças originais, além de não ter assistência técnica capacitada, o que pode resultar em falhas na calibração e falta de precisão nos resultados, gerando erros nos resultados de exames. Já houve casos de chamados de clientes que estavam com problemas em seus equipamentos e, quando o técnico fez a visita, detectou que o equipamento não foi fornecido pelo fabricante original. Nesses casos, não há como dar suporte ao cliente, que fica sem atendimento.
Como o laboratório pode se proteger desses riscos? Em caso de dúvida se o material/equipamento é idôneo, como proceder?
Todo equipamento deve conter a identificação do fabricante, número de série e o número de registro na Anvisa. Se o equipamento for oferecido por uma empresa sem registro junto à Anvisa, ou mesmo se essa empresa não tiver autorização formal do detentor do registro para comercialização do equipamento no país, é bem provável que seja um produto pirata. Nesse caso, a denúncia pode ser feita pela internet, na página da Anvisa (anvisa.gov.br) ou pelo e-mail ouvidoria@anvisa.gov.br.
Como ter acesso à cartilha que estava prevista na campanha de 2009, na parceria entre a CBDL, a Anvisa e o Ministério da Saúde?
O acesso ao conteúdo da cartilha de 2009 ainda pode ser obtido na CDBL. Porém, um novo conteúdo está sendo desenvolvido pela CBDL em conjunto com a Amcham e será apresentado em breve aos associados da CBDL. Esse conteúdo será enviado posteriormente para chancela da Anvisa, com o objetivo de promover a conscientização dos riscos de utilização de produtos pirata na área da saúde. Assim que aprovada a nova cartilha, ela será distribuída, divulgada e publicada no site da entidade.
Por que o registro é uma garantia de segurança? Ou seja, como ele é feito, que critérios precisam ser seguidos, quem faz esse registro?
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é uma autarquia que tem como área de atuação todos os setores relacionados a produtos e serviços que possam afetar a saúde da população brasileira. A Anvisa é o órgão responsável por fornecer registro de produtos na área de diagnóstico in vitro, garantindo que os mesmos possam ser comercializados no país.
Em maio de 2010, por força da RDC 25, para solicitar o registro de um produto, além da submissão ao registro nacional, a Anvisa passou a requerer uma inspeção extrazona nos casos onde o produto é fabricado em outro território. Só depois dessa inspeção é que a Anvisa emite a Certificação de Boas Práticas de Fabricação (CBPF) e a empresa, de posse desse documento, solicita o registro à Anvisa. Assim, são comercializados localmente apenas os produtos que passaram pela inspeção internacional e, posteriormente, pelo registro na Anvisa.
O fluxo atual para se chegar ao registro garante mesmo a segurança dos produtos?
O fluxo atual impede possíveis danos ou riscos à saúde da população, regulamentando, controlando e fiscalizando a produção de bens de consumo relacionados nesta área. Desta forma a Anvisa garante que todos os produtos comercializados no mercado local sejam seguros para a população.
O regulamento técnico para registro de produtos para diagnóstico in-vitro, como reagentes e calibradores, foi atualizado pela Anvisa em 2006, pela RDC 206. As regras anteriores eram de 1996. Que ganhos trouxe essa atualização?
Ao longo dos anos a Anvisa vem dando cada vez mais previsibilidade, transparência e estabilidade aos processos e atuação regulatória, a fim de propiciar um ambiente seguro para a população, além de favorecer o desenvolvimento social e econômico do país. Portanto, essa e outras atualizações trouxeram uma maior regulamentação, e em contrapartida, maior segurança aos pacientes.
Ainda se tratando do regulamento, o que ainda pode melhorar?
Atualmente a maior demora está na inspeção das fábricas internacionais que passou a ser exigida a partir de maio de 2010, por força da RDC 25. O propósito desta resolução foi estabelecer a igualdade entre as certificações de produtos nacionais e importados. No entanto, atualmente, existem mais de mil solicitações de inspeção extrazona para emissão da Certificação de Boas Práticas de Fabricação aguardando por atendimento. Essa fila gerou um atraso de quase quatro anos para o registro de um novo produto. No entanto, no final do ano passado foi publicada uma consulta pública para rever alguns pontos da RDC 25 e agilizar a inspeção nas fábricas. Com isso esperamos que haja uma redução na espera para as certificações internacionais, uma vez que este é o primeiro passo antes da submissão ao registro.
Qual o papel da CBDL nisso?
Fizemos um trabalho forte junto à Anvisa ao longo destes anos, de discussões e sugestões para maior agilidade no processo de certificação e registro. No final do ano passado, com a publicação da consulta pública que vai rever alguns pontos da RDC 25, a inspeção nas fábricas deverá ser agilizada. Ou seja, é possível manter a qualidade do trabalho e otimizar o serviço. Acreditamos e apoiamos a regulamentação, pois ela garante a qualidade e segurança aos pacientes, porém, ela deve ser feita de maneira a não impedir o acesso a novas tecnologias. É isso que queremos evitar em um país em contínuo crescimento, como o Brasil.
contato@cbdl.org.br.
Para chegar a resultados com a qualidade esperada, conhecer as limitações de seus métodos e verificar se os desempenhos apresentados estão dentro das especificações estabelecidas, os laboratórios precisam fazer a validação de seus sistemas analíticos. Para atender a essa demanda, a Controllab está lançando um programa que reúne duas ferramentas de verificação: a de calibração e a de linearidade. As ferramentas foram oferecidas gratuitamente, como parte de um projeto piloto, para 426 clientes que demonstraram interesse em experimentá-las ao responder a uma enquete. Inicialmente, estão sendo usadas na verificação dos sistemas analíticos nos ensaios de colesterol total.
Por meio do estudo da linearidade, é possível verificar capacidade do método em gerar resultados proporcionais à concentração do analito, dentro de uma faixa especificada. Já a calibração compreende um conjunto de operações que estabelece a relação entre os valores indicados por um sistema de medição e a concentração conhecida de um analito (obtido por comparação interlaboratorial). Essas duas ferramentas foram tema do capítulo “Validação do sistema analítico”, do primeiro livro da coleção “Gestão da fase analítica do laboratório”, publicado pela Controllab e disponível online em controlab.com/ensino/livros.
Nas etapas dessa validação, os laboratórios precisam utilizar amostras tanto com altas quanto com baixas concentrações, o que nem sempre é fácil de conseguir. É nesse ponto que entra o novo programa. “São enviados itens produzidos com uma rigorosa diluição seriada, buscando atingir a maior faixa de concentrações, o que permite ao laboratório verificar a linearidade do sistema analítico de acordo com a sua especificação”, explica Rafael Lopes, gestor de Serviços da Controllab.
Participando do programa, o laboratório recebe um relatório com um resumo estatístico e, com isso, pode ter uma ideia de como seu sistema se comporta com materiais de baixa à alta concentração.
Tanto linearidade quanto a calibração devem ser verificadas a cada seis meses, segundo recomendações do Colégio Americano de Patologistas (CAP), que também tem disponível um programa de linearidade/calibração similar ao agora oferecido pela Controllab. Essas verificações periódicas permitem identificar limitações do método ao longo do tempo, bem como identificar desgastes nos sistemas analíticos utilizados.
Ela é fundamental para o laboratório, que sofre vários tipos de interferência no dia a dia, que podem ou não ter influências no sistema analítico. Para ter certeza precisa fazer essas verificaçõesavalia Lopes.
O novo programa está sendo disponibilizado para diversas áreas, entre elas: Proteína C Reativa, Bioquímica (soro e urina), Hematologia, Drogas Terapêuticas, Imunologia, Endocrinologia Reprodutiva, Etanol, Gasometria (com ensaios bioquímicos), Hemoglobina Glicada, Coagulação, Drogas Imunossupressoras , Marcadores Cardíacos e Marcadores Tumorais.
A participação de sete laboratórios de veterinária no primeiro ensaio de proficiência para anemia infecciosa equina, disponibilizado em fevereiro deste ano, foi considerada um sucesso pela Controllab. Na primeira rodada, os laboratórios receberam materiais com resultado positivo e negativo e o desempenho foi de 100% de acerto, em dois kits reportados pelos participantes.
São quatro rodadas ao todo, com dois itens por rodada, variando entre reagente e não reagente, totalizando oito itens no ano. Atingindo o percentual mínimo de adequação no ano, o laboratório recebe um certificado atestando sua proficiência para o ensaio, podendo assim demostrar aos seus clientes a sua confiabilidade.
O ensaio de proficiência é requisito também para o processo de acreditação. Laboratórios credenciados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) estarão, a partir de julho, obrigados a ter a acreditação pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) para a norma ISO 17.025. É quando termina o prazo para adequação, de 36 meses, iniciado em julho de 2011, quando foi publicada a Instrução Normativa nº 34. Os estabelecimentos que não obtiverem o certificado terão o credenciamento suspenso por até 24 meses. Após esse período, a habilitação será cancelada. Hoje, o ministério conta com mais de 400 laboratórios credenciados na Rede Nacional de Laboratórios Agropecuários. Além dos credenciados, a estrutura do Ministério da Agricultura inclui seis Laboratórios Nacionais Agropecuários (os Lanagros) – em Goiás, Minas Gerais, Pará, Pernambuco, Rio Grande do Sul e São Paulo – todos eles já acreditados pelo Inmetro.
A norma 17.025, internacionalmente aceita, é específica para o sistema de gestão da qualidade e define requisitos gerais e técnicos para a competência de laboratórios de ensaio e calibração.
Diante dessa nova realidade, o ensaio para anemia infecciosa equina se tornou uma necessidade. Trata-se de uma doença causada por um vírus que, uma vez instalado no organismo do animal, permanece por toda a vida, mesmo quando não manifestar sintomas. A transmissão ocorre por meio da picada de insetos e moscas e por materiais contaminados com sangue infectado.
A médica veterinária Marilena Anna Damiani, sócia do Laboratório do Cavalo de Esporte, que atende a Sociedade Hípica Brasileira, no Rio de Janeiro, lembra que, além de se adequar à nova lei, se submeter aos ensaios de proficiência é uma maneira eficaz de testar o trabalho do laboratório. “Assim o cliente e o próprio laboratório podem confiar mais no serviço que está sendo oferecido”, atesta ela.
A Controllab pretende ampliar o programa veterinário para uma quantidade maior de ensaios. Já estão sendo feitos estudos para que os novos serviços sejam oferecidos em 2015. Caso algum ensaio da rotina não esteja sendo atendida pelo escopo de controle de qualidade oferecida pela Controllab, essa é a hora de o laboratório entrar em contato e solicitar mais essa ampliação.
A versão brasileira do site Lab Tests Online (LTO), em LAB Tests Online, teve em 2013 quase um milhão de visitantes e chegou ao terceiro lugar entre os 17 países que hoje usam essa ferramenta. O Lab Tests Online BR ficou atrás apenas de Estados Unidos, país em que o site foi criado, e o Reino Unido. A ferramenta foi lançada no Brasil em setembro de 2010, para ajudar pacientes e profissionais a conhecerem os exames laboratoriais. São informações sobre testes, estados clínicos e doenças. O site é mantido pela Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML), sob licença da American Association for Clinical Chemistry (AACC).
Os números são do produtor-executivo do LTO nos EUA, George Linzer, que coordena a rede internacional de sites: no ano passado, LTO BR recebeu 999.713 visitantes e teve 1.678.994 páginas vistas. O volume de tráfego cresceu 30% em relação a 2012. Atrás do site brasileiro ficaram os da Turquia, Espanha, Polônia e Itália.
De acordo com o Dr. Gustavo Campana, diretor de comunicação da SBPC/ML, o crescimento do número de acessos pode ser explicado pela própria mudança na prática da medicina, que vem incluindo o paciente no processo. “Atualmente, os pacientes procuram se informar e discutir com seus médicos as melhores possibilidades. E cada vez mais as pessoas buscarão informações técnicas relacionadas à saúde”, avalia ele, lembrando que é fundamental que a busca de informações leve os pacientes a fontes confiáveis. “O principal benefício da ferramenta é disponibilizar de forma fácil uma informação de qualidade sobre os exames laboratoriais, escrita e revisada por especialistas”, completa Campana. Outro motivo para o crescimento nos acessos é fato de que o link do LTO Brasil está disponível para que os laboratórios clínicos o divulguem em seus próprios portais. No ano passado, 85% das visitas foram para a seção “Exames”. O restante foi para as páginas da seção “Estados Clínicos/Doenças”, que traz artigos geralmente mais abrangentes. Em geral servem para complementar as dúvidas de determinados testes.
A atualização do site é constante. A American Association for Clinical Chemistry é a centralizadora de todas as informações. Especialistas em Patologia Clínica/Medicina Laboratorial do Brasil, associados à SBPC/ML, revisam e elaboram artigos e informações sobre os exames na versão brasileira da ferramenta. Importante lembrar: o site não pretende substituir o médico nem a consulta. Seu objetivo é ser uma fonte pública, gratuita e não comercial sobre exames.
Os testes laboratoriais precisam ser indicados e interpretados com base em dados clínicos, como a história clínica, os sinais e sintomas, o exame físico e, finalmente, a hipótese diagnóstica. Assim, qualquer informação referente a um exame e seu resultado deve ser avaliada pelo médico solicitanteadverte o diretor de Comunicação da SBPC/ML.
A Controllab vai levar mais uma vez o curso sobre Indicadores Laboratoriais para o pré-congresso da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML) marcado para setembro, no Rio de Janeiro. Com a participação de profissionais da empresa e assessores externos, o curso terá a duração de um dia com o objetivo de mostrar como é a implementação dos indicadores na rotina laboratorial. A proposta é que os palestrantes façam considerações gerais sobre os assuntos e os ouvintes partam em seguida para a discussão de situações práticas em grupos.
Cada grupo debate um tema: entre eles, como criar um indicador, implementá-lo e aprimorá-lo. “Tem dado muito certo”, avalia Luiza Bottino, supervisora da Gestão de Serviços. “Os participantes podem dar sugestões, trabalhar em cima de casos reais, tirados de seu próprio dia a dia no laboratório”, explica. Ao fim do curso, cada grupo apresenta suas propostas aos demais.
O 48º Congresso Brasileiro de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (CBPC/ML) vai acontecer de 9 a 12 de setembro no Centro de Convenções Sul América, no Rio. O curso sobre indicadores ocorre um dia antes da abertura do congresso, no mesmo local.
A Controllab também participa do congresso, com estande e nas palestras proferidas por seus colaboradores.
Nairo Massakazu Sumita – Faculdade de Medicina da USP
O termo hemoglobina glicada define um grupo de substâncias formadas a partir da reação entre a hemoglobina A (HbA) e um açúcar. O componente mais importante desse conjunto é a fração HbA1c ou A1C, na qual a glicose liga-se ao grupo amino terminal (resíduo de valina) de uma ou de ambas as cadeias beta da HbA. Hoje, a dosagem da hemoglobina glicada tem grande importância na avaliação do nível de controle do diabetes mellitus e mais recentemente também no diagnóstico.
A dosagem da hemoglobina glicada passou a ser considerada parâmetro essencial na avaliação do controle do diabetes mellitus após a publicação de dois grandes estudos clínicos: Diabetes Control and Complications Trial (DCCT), em 1993, e United Kingdom Prospective Diabetes Study (UKPDS), em 1998. Esses estudos demonstraram que manter o nível de hemoglobina glicada abaixo de 7,0%, no paciente portador de diabetes, reduz, significativamente, o risco do desenvolvimento das complicações.
Em relação aos aspectos analíticos, algumas situações clínicas podem gerar interferências na análise da A1C. As variantes genéticas da hemoglobina, como as hemoglobinas S ou C na condição heterozigótica, podem produzir interferências, resultando valores falsamente elevados ou diminuídos, de acordo com o método utilizado. A dosagem de A1C não se aplica nas condições de homozigose para hemoglobinas anômalas. As doenças que reduzem o tempo de sobrevida das hemácias, como na anemia hemolítica e estados hemorrágicos, podem resultar valores falsamente baixos. A presença de grandes quantidades de vitaminas C e E é descrita como fatores que podem induzir a resultados falsamente diminuídos por inibirem o processo de glicação da hemoglobina. Nos estados de anemia por carência de ferro, de vitamina B12 ou de folato, nos quais ocorre aumento da sobrevida das hemácias, pode ser observada falsa elevação dos valores de A1C. A presença de hemoglobinas quimicamente modificadas, como a hemoglobina carbamilada associada à uremia, e a hemoglobina acetilada formada após a ingestão de elevadas doses de salicilatos, pode elevar falsamente os resultados. Outras condições clínicas que podem elevar o resultado da A1C são: hipertrigliceridemia, hiperbilirrubinemia, alcoolismo crônico e uso crônico de opiáceos.
Com a finalidade de minimizar os problemas de interpretação pelas diferentes metodologias, foi criado nos EUA o National Glycohemoglobin Standardization Program (NGSP), cujo trabalho se iniciou em 1996. Esse programa avalia e certifica os métodos disponíveis no mercado mundial, com o intuito de harmonizar as metodologias para que estas forneçam resultados comparáveis à metodologia utilizada no estudo DCCT. O NGSP também tem um programa de certificação de laboratórios clínicos, cujo certificado tem validade de um ano. O laboratório pode se candidatar a um dos dois níveis de certificação, sendo que a de nível 1 é mais rigorosa. O processo consiste na análise de 40 amostras, as quais podem ser obtidas da própria rotina do laboratório, e posteriormente encaminhadas ao NGSP que irá reanalisar num laboratório de referência. Se os resultados obtidos pelo laboratório candidato estiverem concordantes com os do laboratório de referência, considera-se certificado pelo NGSP. O laboratório candidato pode também optar pelo recebimento das amostras do NGSP, ao invés de utilizá-las da sua rotina. A certificação nível 1 exige que os resultados de, pelo menos, 38 das 40 amostras apresentem variação máxima de +/-6%, em relação aos resultados observados pelo laboratório de referência, além disso necessita monitorar o desempenho analítico a cada 3 meses.
A certificação é o reconhecimento ao esforço do laboratório em implantar um método padronizado e por ter alcançado a harmonização com um laboratório de referência. A dosagem de A1C por um laboratório certificado pelo NGSP fornece um resultado passível de ser interpretado à luz das diretrizes clínicas, garantindo a segurança do paciente. De outro lado, habilita a participação em protocolos de pesquisa clínica a nível internacional. A Divisão de Laboratório Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC -FMUSP) é o único serviço público no Brasil a ter essa certificação do NGSP. Neste ano de 2014, em que está completando 70 anos de existência, reforça assim a vocação para centro de referência.
A hemoglobina glicada origina-se da adição não enzimática de açúcar ao aminoácido valina N-terminal da cadeia beta da hemoglobina A, sendo esta reação não dissociável.