Seja numa indústria ou num laboratório, quando se trata de segurança do trabalho, é sempre mais efetivo cuidar do coletivo antes do individual, ensina a infectologista Cristiane Rapparini, coordenadora do Risco Biológico, projeto criado há 10 anos com a missão de divulgar informações que ajudem na prevenção de acidentes na área de saúde. O melhor a fazer é proporcionar um ambiente seguro antes de pedir para o operário usar o capacete. Ou o enfermeiro a luva. Em entrevista a “Qualifique”, ela ensina a diminuir riscos, diz quais são os desafios da norma brasileira com as diretrizes para a prevenção de acidentes, e fala da importância da medida que obriga o uso de agulhas com dispositivos de segurança.
Mais informação e menos risco
A médica infectologista Cristiane Rapparini recorre a números da Organização Mundial da Saúde (OMS) para dizer por que a recente exigência de dispositivos de segurança nos materiais perfurocortantes usados por profissionais de saúde chega em boa hora no Brasil. Em 2000, a estimativa da OMS era da ocorrência de 2 a 3 milhões de acidentes no mundo todo com agulhas contaminadas por material biológico. Deste total, seriam 2 milhões de casos de exposição ao vírus da hepatite B, 900 mil ao vírus da hepatite C, e 170 mil ao vírus da Aids (HIV). Como resultado, ainda segundo as estimativas da OMS em 2000, podem ter ocorrido 66 mil casos de hepatite B, 16 mil de hepatite C e mil de infecção pelo HIV entre trabalhadores do setor.
O dispositivo de segurança em agulhas e cateteres já estava previsto na Norma Regulamentadora número 32, do Ministério do Trabalho, de 2005, e começou a valer no fim do ano passado. Na avaliação da doutora em infectologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a medida é um importante passo. Mas é grande o desafio: o custo, a disponibilidade dos materiais e a adaptação do profissional.
Outra frente a ser trabalhada é a disseminação da informação. Também segundo a OMS, embora 90% das exposições ao risco ocorram em países em desenvolvimento, 90% das notificações são feitas por Estados Unidos e Europa. Isso mostra a importância de criação de sistemas de vigilância em países em desenvolvimento como forma de melhorar a prevenção. “Podemos estar só vendo a ponta do iceberg”, acredita a infectologista, que em seguida cita uma frase de especialistas da Universidade da Virgínia, nos EUA, um dos grupos pioneiros em prevenção de acidentes com material biológico: “No data, no problem”. Ou seja, se não há dados, “parece que” não há problema; e sem informação não há como prevenir.
Qual o foco principal da NR32 e o maior benefício proporcionado por ela?
A Norma Regulamentadora número 32 do Ministério do Trabalho, publicada em 2005, é a primeira a estabelecer as diretrizes básicas para a implementação de medidas de proteção à segurança e à saúde dos trabalhadores da área. É um marco muito importante. Para fins de aplicação da norma, “entende-se por serviços de saúde, qualquer edificação destinada à prestação de assistência à saúde da população, e todas as ações de promoção, recuperação, assistência, pesquisa e ensino em saúde em qualquer nível de complexidade”. A questão da edificação é importante porque inclui todos os trabalhadores, como funcionários das equipes de higienização e limpeza, por exemplo, e não apenas as clássicas categorias de profissionais da saúde.
Os profissionais passaram a prestar mais atenção à prevenção. Ainda há quem ache que basta vestir um jaleco branco para se sentir protegido, mas isso vem mudando. Cresce a ideia de que é importante também “cuidar de quem cuida”.
Como o Brasil está em prevenção?
É muito difícil comparar o Brasil com outros países porque até pouco tempo atrás não tínhamos números consolidados, não existia um sistema nacional de notificação de acidentes de trabalho com material biológico.
Isso começou a mudar com a publicação pelo Ministério da Saúde da Portaria 777/2004, que regulamenta a notificação compulsória de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, incluindo os acidentes com material biológico, através do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Antes disso, só o município do Rio de Janeiro e o estado de São Paulo tinham um sistema de vigilância de tipo de acidentes. O do município do Rio foi criado em 1997 e o do estado de São Paulo, dois anos depois. Desde 1997, o Rio notificou 24 mil acidentes com material biológico. Em São Paulo, foram 14 mil notificações de 1999 a 2005. Os dois sistemas agora migraram para o nacional.
Nos dados do Sinan, de 2007 para cá, foram registrados 85 mil acidentes com material biológico. Mas acredito que ainda temos uma importante subnotificação. É a ponta do iceberg.
O que se pode dizer é que, nos últimos anos, o número de acidentes na área da Saúde registrados nas Comunicações de Acidentes de Trabalho (CAT) do Ministério da Previdência tem ultrapassado outras áreas consideradas de alto risco como o da construção civil.
A título de comparação, nos anos de 1997- 1998, os Estados Unidos tinham uma estimativa de mil acidentes por dia.
Um dos grupos pioneiros em prevenção, da Universidade da Virginia, tem uma frase interessante: “No data, no problem” (sem informação, sem problema). Ou seja, só começamos a “ver” que há um problema quando fazemos vigilância. Se não temos os dados, é como se o problema não existisse.
Há números específicos para laboratórios?
Virtualmente, qualquer categoria profissional pode estar sob risco. A maioria dos casos de acidentes envolve a equipe de enfermagem. O grande número de casos é consistente com o fato de ser o maior grupo de profissionais nos serviços de saúde. Como muitas vezes não temos taxas disponíveis (número de acidentes/número de trabalhadores na ocupação), esta pode ser uma informação um pouco distorcida. Considerando-se todas as categorias ocupacionais, o percentual de acidentes entre profissionais de laboratórios é inferior a 5%: 1,9% no Sinan (Brasil), 5,0% no município do Rio de Janeiro, 0,9% no município de São Paulo e 2,4% no estado de São Paulo. Mas estes números podem não refletir a realidade. É possível que exista importante subnotificação de acidentes entre trabalhadores que exercem atividades de laboratório. Um dado que corrobora com esta afirmação é o grande número de profissionais de laboratório infectados pelo HIV nos EUA por exposição ocupacional.
O número de profissionais de laboratório infectados é desproporcional ao número de indivíduos na força de trabalho. Nos EUA, por exemplo, os flebotomistas correspondem a menos do que 1/20 do número de profissionais das equipes de enfermagem.
Qual seria o maior risco a que os profissionais de saúde em geral estariam sujeitos?
Os principais riscos nos serviços de saúde, entre os patógenos de transmissão sanguínea, são os vírus das hepatites B e C e o HIV. Sabe-se que o risco de ser infectado pelo vírus da hepatite B num acidente é cem vezes maior que o de se contaminar pelo HIV. O risco de contágio de hepatite C é de 10 vezes em relação à contaminação por HIV. Tanto hepatite B quanto C também podem evoluir de forma grave, com comprometimento do fígado, cirrose, hepatocarcinoma e até morte.
Em 1991, nos EUA havia estimativa de 8.700 casos por ano de hepatite B entre profissionais da saúde por acidente, com 200 mortes. Este número era inaceitável. A Occupational Safety and Health Administration (OSHA), equivalente ao nosso Ministério do Trabalho, estabeleceu normas rígidas relacionadas à prevenção de exposição a patógenos de transmissão sanguínea. Se o hospital não cumprir, pode ser multado e fechado. Eu destaco duas medidas fundamentais dentro destas normas: a vacinação contra hepatite B (o empregador tem dez dias para oferecer e vacinar gratuitamente o funcionário após sua a contratação) e o treinamento. Todos tem que ser treinados na admissão e depois anualmente. Com estas recomendações, três anos depois (1994), o número caiu para mil casos por ano e 18 mortes. Hoje, a incidência de hepatite B é menor entre profissionais de saúde do que na população em geral. A mensagem que eles nos dão é que é possível prevenir.
A nossa NR 32 também diz que é preciso fazer treinamento na admissão, anualmente e sempre que o profissional mudar de função. Este último reconheço que é difícil acontecer. É preciso registrar quem foi treinado e por quem.
E no Brasil, como estamos de vacinação?
Em 1997, apenas 30% dos profissionais de saúde acidentados no município Rio de Janeiro tinham história de vacinação prévia contra hepatite B, por exemplo. Isto mudou. Hoje, podemos considerar que cerca de 75% dos trabalhadores da saúde são vacinados contra hepatite B nos diferentes municípios do país. Vale destacar que o grupo de profissionais com percentual maior de vacinação é o de dentistas. Aliás, temos muito a aprender com eles. Dificilmente você vai a um consultório odontológico e encontra um dentista que não esteja usando luvas, óculos de proteção e máscara. O que não acontece quando se vai a um hospital, onde ainda é muito frequente encontrarmos trabalhadores fazendo procedimentos envolvendo material biológico (como punção venosa periférica) sem o uso de luvas, por exemplo.
Entendemos que temos desafios como vacinar os profissionais e reduzir o número de acidentes com perfurocortantes. Algo mais?
Os desafios são inúmeros. A NR32 não trata exclusivamente de riscos biológicos. Outros aspectos importantes, por exemplo, estão relacionados a questões ergonômicas e às condições de exposição a substâncias químicas, como reagentes utilizados em laboratórios. No programa de prevenção de riscos ambientais (PPRA) deve constar inventário de todos os produtos químicos, inclusive intermediários e resíduos, com indicação daqueles que impliquem em riscos à segurança e à saúde do trabalhador.
O uso de perfurocortantes com dispositivos de segurança é essencial para evitar acidentes? Que outros procedimentos devem ser enfatizados?
É importante entender o conceito de “hierarquia de estratégias de controle” na prevenção de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. Em anos recentes, os serviços de saúde vêm adotando este modelo para priorizar as intervenções de prevenção. Na hierarquia da prevenção de acidentes com perfurocortantes, a primeira prioridade é eliminar e reduzir o uso de agulhas e outros perfurocortantes onde for possível (por exemplo, evitando-se injeções desnecessárias). A próxima é isolar o perigo através do uso de um controle de engenharia no ambiente ou no próprio perfurocortante, dessa forma impedindo que o elemento perfurante ou cortante fique exposto em qualquer lugar do ambiente de trabalho. Quando essas estratégias não estão disponíveis ou não fornecem proteção completa, só então é que o foco deve ser na implementação das mudanças na prática de trabalho e do uso de equipamentos de proteção individual. É sempre mais efetivo cuidar do coletivo antes do individual. O melhor a fazer é proporcionar um ambiente seguro antes de pedir para o operário usar o capacete.
No caso dos laboratórios, como devem ser as medidas no manuseio dos perfurocortantes? Além da luva e dos dispositivos de segurança?
Outras recomendações importantes são: ter máxima atenção durante a realização de procedimentos que envolvam o uso de perfurocortantes; observar o posicionamento adequado do paciente antes da realização dos procedimentos (especialmente crianças que podem ter movimentos súbitos e inesperados durante os procedimentos e causar acidentes); não reencapar agulhas; não usar os dedos como anteparo durante a realização dos procedimentos; fazer o descarte adequado de materiais perfurocortantes, em recipientes rígidos e resistentes à punctura.
Os coletores de perfurocortantes devem ser disponibilizados sempre em tamanho e em número suficientes e colocados sempre próximo ao local de realização dos procedimentos para o descarte imediato. Além disso, devem ser colocados em suportes apropriados (por exemplo, suportes de parede) e em altura apropriada (que permita a visualização da abertura para descarte). Coletores cheios acima do permitido têm sido causa frequente de acidentes. É fundamental respeitar o limite de enchimento do coletor que deve ser de no máximo 2/3 de sua capacidade ou 5cm abaixo do bocal de abertura.
Como vem sendo a implementação dos materiais perfurocortantes com dispositivo de segurança nos hospitais e laboratórios públicos e privados?
Em 2005, já havia na NR32 (Norma Regulamentadora número 32) a previsão do perfurocortante com dispositivo de segurança (“Deve ser assegurado o uso de materiais perfurocortantes com dispositivo de segurança, conforme cronograma a ser estabelecido pela Comissão Tripartite Permanente Nacional da NR-32”). Foram três anos de discussão até a publicação da portaria que regulamentou a exigência, em 2008 (MTE/GM Portaria 939/2008): “Os empregadores devem promover a substituição dos materiais perfurocortantes por outros com dispositivo de segurança no prazo máximo de vinte e quatro meses a partir da data de publicação desta Portaria” (06 meses para divulgação e treinamento e 18 meses após para implementação e adaptação de mercado).
No caso do setor público, uma coisa me surpreendeu: em 2007, mesmo antes do prazo de exigência legal terminar, já havia licitação em pelo menos um município de 18 das 27 unidades da federação para compra de algum destes perfurocortantes com dispositivos de segurança.
Há no mercado número suficiente destes dispositivos para atender à nova demanda?
Antes da publicação da portaria, a CTPN reuniu as empresas através da Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos, Odontológicos, Hospitalares e de Laboratórios (Abimo) e da Associação Brasileira dos Importadores de Equipamentos, Produtos e Suprimentos Médico-Hospitalares (Abimed) para estudar a disponibilidade de perfurocortantes com dispositivos de segurança no país, discutir as questões relacionadas a capacidade fabril e a custos e à capacidade das empresas em realizar os treinamentos. Somente depois desta avaliação, foi publicada a portaria ministerial exigindo a substituição por perfurocortantes com dispositivos de segurança.
Não é fácil implementar dispositivos de segurança. Ter o dispositivo não quer dizer que o profissional vai usá-lo. Mesmo nos EUA, onde a lei foi publicada há 10 anos, ainda há profissionais de saúde que optam pelo uso de dispositivos convencionais, ao invés dos de segurança, se eles estão disponíveis nos postos de atendimento. Idealmente, o dispositivo de segurança deve interferir o mínimo no procedimento. Caso contrário, o treinamento e a adaptação demoram ainda mais.
O desafio é grande: quanto a custo, disponibilidade de materiais e adequação. Ainda estamos enfrentando problemas de empresas que não estão atendendo à demanda e o preço também tem sido um fator restritivo. Há menos de cinco anos, alguns dispositivos de segurança chegavam a custar 8 vezes mais do que os dispositivos convencionais. Isto tem mudado com o aumento do consumo e do mercado. Atualmente, dependendo do produto, custam 1,5 a 2 vezes mais. A maioria ainda é importada.
Segundo o Programa de Indicadores da Controllab, 70 laboratórios reportaram seu índice de acidentes em 2010. Embora existam relatos de até 130 acidentes com perfurocortante/milhão de pacientes coletados (ou 0,013% de acidentes, frente às oportunidades), mais da metade não teve ocorrência no ano.
É importante analisar estas informações com cautela, incluindo se foram avaliados também os acidentes indiretamente relacionados com a coleta de sangue, por exemplo, como aqueles que acontecem após a realização do procedimento e antes do descarte, ou aqueles durante o descarte e após o descarte. Confesso que tenho dificuldades de acreditar em serviços de saúde que não tenham ocorrências de acidentes com material biológico. Não estou dizendo com isso que os serviços estão omitindo a informação. Estou reforçando a necessidade de se avaliar a possibilidade de subnotificação, que pode estar relacionada a diferentes fatores como a possibilidade de o trabalhador desconhecer os riscos a que está exposto e as formas de exposição envolvendo os patógenos de transmissão sanguínea (pode considerar o paciente como sendo “de baixo risco” ou a exposição não ter sido grave). Ou mesmo ao fato do trabalhador não notificar pelo medo de ser repreendido ou demitido.
Recentemente (2008), o Centers for Disease Control and Prevention (CDC-EUA) publicou um manual de prevenção de acidentes, onde consta a meta de “eliminação destas infecções ocupacionais”. O conceito de eliminação em doenças infecciosas representa a máxima redução da incidência de infecção por um determinado patógeno, em uma área geográfica definida, como resultado de esforços deliberados; medidas contínuas para impedir o restabelecimento da transmissão são necessárias.
No 5º Fórum de Indicadores Laboratoriais (Controllab-SBPC/ML), um laboratório constatou ter mais ocorrências entre colaboradores até 29 anos de nível médio. Entre as causas, foi muito citada a ’atitude’ do profissional.
É muito frequente a descrição de maior número de acidentes entre estudantes, estagiários, trabalhadores jovens e com menor escolaridade. Mas isto não é regra. Em alguns serviços de saúde, há maior ocorrência de acidentes entre trabalhadores com 20 a 30 anos de formação, o que poderia refletir dificuldades na adaptação a novos equipamentos e na dificuldade em mudar práticas de trabalho já estabelecidas.
Pode ser preocupante a citação de que a “atitude” (desatenção, falta de cuidado, descuido, irresponsabilidade, negligência, etc.) tenha sido uma causa frequente de acidentes. Explicações que responsabilizam individualmente os trabalhadores podem se sustentar no processo de naturalização dos riscos, como se estes fossem naturais, inevitáveis e inerentes ao trabalho. É preciso entender a complexidade dos fatores e processos envolvidos nos acidentes. Um aspecto organizacional, conhecido como cultura de segurança, tem especial importância. Estudos têm sido publicados mostrando que serviços com forte cultura de segurança registram um número menor de acidentes.
Isto ocorre não apenas porque o local de trabalho tem programas de segurança bem desenvolvidos e efetivos, mas também porque a gestão, através destes programas, envia sinais do comprometimento da organização com a segurança de seus trabalhadores. Uma cultura de segurança é o comprometimento compartilhado de gestores e trabalhadores. Ela permeia todos os aspectos do ambiente de trabalho. Encoraja cada indivíduo a se responsabilizar pela segurança e a prestar atenção ao que estiver relacionado a ela.
Voltando à NR 32. Ela necessita de aperfeiçoamento?
Sempre são necessários aperfeiçoamentos e atualizações nas normatizações. A comissão tripartite se reúne regularmente para acompanhar e discutir a norma e para responder às questões e dúvidas que chegam de sindicatos, conselhos de classes, sociedades científicas, hospitais e laboratórios. Já saiu um guia técnico de risco biológico e deverão sair manuais para cada um dos outros itens abordados pela norma (riscos envolvendo quimioterápicos, radiações ionizantes, etc..). Ainda tem muitas pessoas que consideram que, pelo fato da NR estar dentro do capítulo de Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ela só valeria para serviços de saúde privados, com contratos de trabalho regidos pela CLT, e não para os serviços públicos, onde funcionários são estatutários. Mas se o hospital público tem um funcionário sequer terceirizado, que seja celetista (e sempre tem), é preciso cumprir a norma. Além disso, tem sido o entendimento em grande parte dos processos que, quando não há normatizações específicas para as condições de saúde e segurança de trabalhadores estatutários, as NR podem ser utilizadas como referência. Mas, sem dúvida, os privados é que têm sido alvo da fiscalização mais intensa.
No site Risco Biológico é possível encontrar diversos textos sobre o tema e também referências e links.
As iniciativas ainda estão restritas aos estados: primeiro foi Santa Catarina, que em setembro do ano passado proibiu a venda e o uso de termômetros de mercúrio em farmácias e em hospitais. Em seguida, foi a vez de a Secretaria de Saúde de São Paulo vetar a compra, pela rede estadual, de instrumentos de medição de temperatura e pressão que contenham mercúrio. Os termômetros e esfigmomanômetros em uso hoje deverão ser substituídos até o fim de 2012 por modelos alternativos. Agora, um projeto de lei semelhante à resolução de São Paulo começa a tramitar na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul.
Para os que buscam banir o uso de equipamentos e materiais com mercúrio em nosso país, porém, isso ainda é pouco. São especialistas como a médica auditora do Ministério do Trabalho Cecília Zavariz, que desde 1980 estuda o tema e hoje defende uma legislação federal sobre o assunto. Cecília vem trabalhando desde 2003 junto a hospitais da rede municipal e estadual e laboratórios clínicos de São Paulo para eliminar o metal do ambiente. A resolução da secretaria formalizou o que já acontecia na prática, segundo ela, graças ao programa da Delegacia Regional do Trabalho de São Paulo. Com mestrado e doutorado sobre o tema na Faculdade de Saúde Pública de São Paulo (USP), Cecília vem atuando nas instituições de saúde, propondo acordos para a substituição dos produtos. Os acordos vêm após a conscientização sobre os riscos do mercúrio para saúde e o meio ambiente. O que não é fácil, segundo ela, uma vez que os sintomas da contaminação podem ser confundidos com os de diferentes patologias. Alguns sintomas são insônia, dor de cabeça, irritabilidade, gosto de metal, gengivite e gastrite.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no entanto, informou que não há tendência de se proibir, no âmbito nacional, produtos como os termômetros de mercúrio. Ainda de acordo com a Anvisa, os modelos em uso no Brasil são seguros e certificados pelo Inmetro. São todos importados – não se fabricam mais termômetros de mercúrio no Brasil.
“Termômetros quebram facilmente”, rebate Zuleica Nycz, coordenadora da Associação de Proteção ao Meio Ambiente de Cianorte (PR), que no Brasil representa a campanha internacional “A vida sem mercúrio: para os bebês, para você e para mim”, organizada pela rede de ONGs internacionais Ipen (Rede Internacional de Eliminação de Poluentes Orgânicos Persistentes). “As embalagens não trazem advertências claras sobre o perigo do material que a pessoa está comprando e levando para casa”.
O preço é um dos maiores empecilhos à popularização dos termômetros digitais. No caso de São Paulo, a expectativa da Secretaria estadual de Saúde é de que as despesas geradas com a compra dos termômetros mais caros sejam amortizadas a longo prazo. Ainda de acordo com a secretaria, o custo dos termômetros digitais é, em média, três vezes maior do que os dos termômetros de mercúrio. Mas os digitais têm durabilidade 15 vezes maior.
Enquanto não se discute uma lei nacional sobre os termômetros, Cecília Zavariz acredita que o debate sobre a proibição do mercúrio no amálgama odontológico tem que ser intensificado. Pela resolução do governo de São Paulo, também está proibida a compra do material, exceto o pré-dosado e pré-acondicionado em cápsulas seladas. “Deveria ter proibido o uso de vez“, avalia.
Outra frente é a da conscientização sobre o uso das lâmpadas fluorescentes, que, muitos não sabem, também contêm mercúrio. Neste caso, como não há ainda no mercado produtos que as substituam, como as lâmpadas de led para uso doméstico, não é possível fazer acordo para trocas. “A gente preconiza o que é possível fazer, como tomar cuidados com descarte e evitar que se quebrem”, diz ela, que defende junto ao Ministério do Meio Ambiente a obrigatoriedade do fabricante orientar o consumidor sobre a destinação adequada do produto. “Mas precisamos de legislação”, reitera.
Na Divisão de Laboratório Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, por exemplo, as lâmpadas passaram a ser enviadas para um serviço específico de reciclagem. Este foi apenas um dos itens do programa iniciado em 2009 para reduzir a zero o uso do mercúrio nas suas atividades. Entre outras medidas, o laboratório fez um levantamento de todos os reagentes e equipamentos que utilizavam o metal em sua composição; analisou o nível de liberação do metal na rede de esgotos e, ao verificar que estava acima do preconizado por lei, instituiu avaliações; e passou a fazer inspeções internas periódicas para manter a área livre de mercúrio. Tudo isso levou uma equipe do Ministério do Trabalho a conferir uma menção honrosa à Divisão do Laboratório Central em maio de 2010.
Ciente de que toda empresa tem sua parcela de responsabilidade social, a Controllab investe, há cerca de quatro anos, num projeto que dá esperança de um futuro melhor a crianças das comunidades no entorno de sua sede, no bairro de Benfica, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Batizado de L’avenir (“o futuro”, em francês), o programa atende a 55 crianças e adolescentes, de 2 a 17 anos, que têm à disposição aulas de reforço de português e matemática durante a semana, mais teatro, artes plásticas e música (incluindo banda e coral) aos sábados. Trata-se de um trabalho multidisciplinar, no qual a empresa investe na vida intelectual, afetiva e social das crianças.
Os alunos chegam por indicação de funcionários da empresa – são filhos, netos e amigos dos funcionários – e nada pagam pelos cursos. Eles só precisam ser assíduos, ter boas notas na escola e vontade de participar. E o entusiasmo é grande, como atesta Dulcinéia de Brito, coordenadora pedagógica dos projetos sociais da Controllab: “Não temos problemas de disciplina. De tão animadas, há crianças que chegam aqui às 7h da manhã, uma hora antes de as aulas começarem. A alegria delas é contagiante, são muito participativas e questionadoras”.
O projeto L’avenir nasceu da percepção do presidente da Controllab, Marcio Biasoli, de que muito ainda precisava ser feito para assegurar igualdade de oportunidades para todos. E que cabe a cada um fazer sua parte. “Se é para ajudar, é importante começar com quem está por perto”, atesta ele, que decidiu investir nas crianças da vizinhança da empresa. O projeto teve início com a concessão pela Controllab de bolsas de estudo de informática para jovens e hoje reúne uma equipe especializada de 15 profissionais contratados pela empresa, entre professores e pessoal administrativo. A Controllab fornece todo o material necessário para as aulas, arca com os custos de transporte e oferece lanche para os alunos.
“Nós não trabalhamos com voluntários, custeamos tudo, nem pedimos contrapartida do governo, como isenção de impostos”, afirma o presidente da Controllab. “É muito importante que as empresas façam sua parte. E é tão fácil fazer um trabalho desses com crianças, basta decidir e fazer”, ensina Biasoli.
O programa ainda vai crescer: além da abertura de laboratórios de experiências científicas e de informática, estavam previstas para começar em abril aulas de educação física aos sábados, numa parceria com a Vila Olímpica da Mangueira, um bem sucedido projeto na comunidade vizinha que já revelou atletas de elite.
E o L’avenir já gerou filhotes. Criado inicialmente para estimular as mães que levavam seus pequenos às aulas de reforço e artes a terem uma profissão, o curso de corte e costura foi ampliado para o público externo e já tem hoje quatro turmas, atendendo a um total de 32 mulheres da comunidade. Conta ainda com apoio de uma estilista voluntária, que doa os tecidos para as aulas práticas e leva profissionais do segmento para compartilhar sua experiência. Em junho, deverá ocorrer o primeiro desfile de moda com criações das aprendizes. “Estamos oferecendo também chances para estas mulheres mudarem suas vidas, é possível notar até aumento da autoestima”, avalia Dulcinéia.
O laboratório Santa Luzia, de Florianópolis (SC), trabalha com dois processos de acompanhamento de colaboradores: a administração de desempenho e a avaliação da competência. A administração de desempenho foi implantada em 1996 e a avaliação da competência, em 2005. Ambos seguindo a literatura, com revalidação anual com os gestores e aperfeiçoamento ao longo dos anos.
O processo de administração de desempenho é uma ferramenta gerencial que contribui para as metas operacionais e estratégicas da organização e para o desenvolvimento dos colaboradores. Possibilita buscar os meios necessários ao autodesenvolvimento, através da participação e do conhecimento dos resultados da avaliação. Mantém a motivação e o compromisso com os objetivos da empresa; identifica os que necessitam de treinamento e os comportamentos que não estão alinhados; estimula o feedback entre colaborador e gerência. A primeira etapa é a de planejamento: o gestor negocia com o colaborador os objetivos no período predeterminado, através de metas de resultados, como valor e prazo, e os recursos necessários (financeiros, equipamentos, espaço físico, treinamento). A segunda é a de acompanhamento: o gestor direto administra o desempenho de seus colaboradores por meio de reuniões periódicas (preferencialmente trimestrais), nas quais são analisados os resultados obtidos até então, o que possibilita identificar ajustes e redefinição de metas. Na terceira etapa, o gestor reúne-se com os respectivos colaboradores individualmente para as avaliações. A finalidade é analisar os resultados obtidos em cada meta e dar o feedback.
O processo de avaliação da competência é feito durante e após o treinamento de novos colaboradores, após o treinamento dos profissionais que irão assumir novos processos, e periodicamente para verificar se têm o conhecimento, as habilidades e a atitude correta nos processos. Devem ser avaliados os critérios cognitivo (conhecimento), afetivo (atitudes) e psicomotor (habilidades). O processo é dividido em avaliação inicial e avaliação contínua da competência. A inicial é realizada pelo ministrante após o treinamento teórico e prático. Já avaliação contínua verifica se os colaboradores seguem os procedimentos de acordo com o padrão. O gestor define quais processos e/ou procedimentos devem ser avaliados a cada ano de acordo com o impacto das atividades executadas, sua natureza e o desempenho do colaborador. Quando o colaborador não é avaliado como competente para realizar determinado processo, deve ser dado mais tempo para prática sob supervisão e/ou outro treinamento, antes de uma reavaliação. O instrumento de reavaliação pode ser o mesmo usado anteriormente, focando naquilo em que o colaborador foi reprovado.
Ao elaborar um instrumento de avaliação, deve-se levar em conta certos critérios que legitimarão todo o processo. São eles: confiabilidade, comportamento ético, transparência e justiça, imparcialidade, foco no desenvolvimento de competência, foco no período que está sendo avaliado e flexibilidade na forma de comunicação. O gestor deve saber que é muito importante ressaltar os pontos fortes e depois os pontos a serem melhorados, evitar o uso da subjetividade e usar dados reais, estabelecer compromisso e plano de ação e falar em seu nome próprio. Deve-se evitar “panos quentes”; levar em conta características pessoais extra cargo e obstáculos políticos e interpessoais; basear-se em acontecimentos recentes e supervalorizar as qualidades potenciais. Em resumo: as avaliações de desempenho e da competência permitem identificar colaboradores que necessitam de aperfeiçoamento; descobrir talentos; facilitar o autodesenvolvimento; avaliar programas de treinamento; validar processo de recrutamento e seleção; tomar decisões relacionadas a demissões e transferências; melhorar as relações; e incentivar a retroalimentação (feedback).
Referências para administração de desempenho
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IARA, Janayna. Artigo: Avaliação de Desempenho no Modelo de Gestão por Competências. Universidade Tuiti do Paraná, 2004.
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RESENDE, Enio. A Força e o Poder das Competências. Rio de Janeiro: Qualitymark Editora, 2004.
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Referências para Avaliação da Competência
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